27 maio 2006

Rejeição da institucionalização pelo idoso

A institucionalização de um idoso implica o abandono do seu espaço e a adaptação a um novo meio. O problema é que muitas vezes o desenraizamento leva a uma deterioração física e mental. Muitos idosos que não têm apoio familiar (ou que não têm sequer família) vêem-se, por vezes, forçados a viver num lar por falta de alternativas. Este caso é muito frequente em idosos que vivem sós, com demências ou com elevado nível de dependência.

Nos últimos tempos tenho tido contacto com situações de rejeição à institucionalização.
Recentemente conheci o caso de uma idosa que desenvolveu um quadro de depressão após a institucionalização. Refere constantemente vontade de morrer manifestando um enorme desapego da vida. Iniciou um quadro de recusa alimentar tendo sido hospitalizada alguns dias depois para compensação metabólica. Actualmente está a ser alimentada por sonda nasogástrica para garantir a correcta hidratação e aporte de nutrientes.

Começo a ficar preocupado pois este caso não é o primeiro que conheço e, provavelmente, não será o último. Esta é uma temática que passa despercebida a uma sociedade que vive à velocidade da luz e que, cada vez mais, considera que os idosos são "uma pedra no sapato".

Oxalá as coisas mudem, para melhor...

Alguns links de interesse:
http://www.ipv.pt/millenium/Millenium32/10.pdf
http://www.portaldoenvelhecimento.net/modos/depressao.pdf
http://www.psicologia.com.pt/artigos/textos/A0281.pdf
http://www.ppg.uem.br/Docs/ctf/Saude/2002/10_Mauro%20Porcu_Estudo%20comparativo_216_02.pdf

24 maio 2006

Aquela sensação: "Se eu tivesse..."

A vida tem destas coisas...
Há dias, quando estava a prestar cuidados de Enfermagem a utentes de um lar, fui chamado para ir observar uma idosa de noventa e tal anos que apresentava queixas inespecíficas.

Quando me aproximei dela pareceu-me estar com o estado geral habitual. Referia no entanto que se sentia "diferente" e "estranha". Disse-me posteriormente que sentia uma ligeira vertigem ao deambular e que estava a descansar no sofá por isso mesmo.

Avaliei-lhe então a tensão arterial e o pulso radial. Apesar de ter uma discreta taquicardia (cerca de 103 bat/min) não apresentava alterações que justificassem a sintomatologia. A hipótese de hipoglicémia não se colocou pois não era diabética nem havia sintomatologia que podesse indicar esta hipótese.
Para além do desequilíbrio, não havia qualquer alteração neurológica perceptível.

Como não apresentava nenhum dado objectivo que justificasse uma deslocação ao SU, aconselhei-a a descansar e, caso os sintomas persistissem, a falar com a médica.

Não queiram saber qual é o meu espanto quando 2 dias depois fico a saber que tinha falecido na noite daquele dia... Fiquei com aquela sensação "Se eu tivesse enviado a senhora ao SU..."
Questionei então as pessoas que conheciam melhor a senhora e disseram-me que "tinha feito um exame ao coração e o médico disse-lhe que o coração dela estava muito fraquinho".

Apesar de tudo teve uma morte que eu, quando chegar a minha vez, desejo para mim: sem sofrimento! Tomara eu poder viver até aos noventa e tal com a qualidade de vida/saúde com que aquela senhora viveu. Nós é que temos um pouco a mania que todos temos de viver mais de 100 anos e que somos eternos. O certo é que todos temos o nosso momento e, o dela, era aquele. Que Deus a guarde em eterno descanso.

19 maio 2006

"Por esse salário não vale a pena estudar para Enfermeiro!"

Um jovem teve um acidente de bicicleta e fez várias feridas por abrasão no hemicorpo esquerdo. Iniciou tratamento ontem e hoje veio novamente para continuação. No final do tratamento agendavamos nova hora para amanhã e comentei que de tarde não poderia estar presente por compromissos. Há uma reunião com o conselho de administração do nosso hospital para falarmos sobre uma problemática relacionada com as horas suplementares.

Desabafei, então, que o mês passado o meu salário baixara cerca de 200€ e que ganhara cerca de 820€. A familiar do jovem exclamou de imediato:

- Por esse salário não vale a pena estudar para Enfermeiro. Andar a queimar neurónios e gastar dinheiro aos pais para depois ganhar menos dinheiro que um trolha!? O meu marido trabalha nas obras e ganha 1250€!

Ao que eu acrescentei:

- E provavelmente não trabalha nos fim-de-semana, feriados e de noite!

Realmente dá que pensar... Penso que o trabalho de trolha é duro e que o salário provavelmente até estará ajustado (mas sei de muitos que ganham bem menos que isto!). Certamente o nosso é que está desajustado! Somos licenciados e continuamos a ganhar como bacharéis.

Incentivaram as pessoas a frequentar um complemento para obtenção do grau de licenciado, obrigando a grandes sacrifícios pessoais, familiares e financeiros, e agora não alteram a carreira conforme se falou.

Da maneira que as finanças estão, vamos continuar a ganhar como bacharéis durante muito tempo!!

15 maio 2006

Esta vida de Enfermeiro...

"Esta vida de enfermeiro está a dar cabo de mim..."

A música dos Sitiados poderia muito bem ser assim mas, de facto, não é.
Diga-se, em abono da verdade, que só dará cabo de mim se as coisas não mudarem...

Trabalho há apenas cinco anos e tenho visto muita coisa mudar. Umas para melhor, outras para... menos bem (só para ser politicamente correcto).

A primeira coisa que vi mudar (e que agora vejo como nos irá afectar a todos) foi o aumento exponencial do número de enfermeiros formados por ano. Será que faz sentido continuar a formar enfermeiros para vagas virtuais? Sim, porque todos sabemos que realmente fazem falta mais enfermeiros, mas o facto é que não há dinheiro para os contratar.
Quem fica a ganhar com isto são os administradores sem princípios, que vêem nisto uma oportunidade de contratarem enfermeiros por ordenados absurdos, usando o princípio de que alguém se irá sujeitar às condições na falta de melhor...

Aos poucos estamos a ver a nossa profissão cada vez mais desvalorizada pois transparece a imagem que se pode tirar o curso de Enfermagem em qualquer escola da esquina. Vemos alunos a estagiar em instituições sem condições para lhes proporcionar experiências relevantes e a saírem do curso com melhor classificação do que aqueles que tiveram de mostrar o seu valor em instituições prestigiadas no que concerne à formação.

Enfim, temos que nos esforçar para dignificar o mais possível a nossa profissão uma vez que todas estas contrariedades só nos puxam para trás. Eu continuo a ter muito prazer em ser enfermeiro e em cuidar de pessoas, mas todos temos um limite. Espero que as contrariedades terminem rapidamente e inicie uma nova fase.

Custa-me acreditar que uma profissão como a de Enfermagem (que é um pilar fundamental da Sáude) possa estar a perder o respeito social que adquiriu.