24 maio 2006

Aquela sensação: "Se eu tivesse..."

A vida tem destas coisas...
Há dias, quando estava a prestar cuidados de Enfermagem a utentes de um lar, fui chamado para ir observar uma idosa de noventa e tal anos que apresentava queixas inespecíficas.

Quando me aproximei dela pareceu-me estar com o estado geral habitual. Referia no entanto que se sentia "diferente" e "estranha". Disse-me posteriormente que sentia uma ligeira vertigem ao deambular e que estava a descansar no sofá por isso mesmo.

Avaliei-lhe então a tensão arterial e o pulso radial. Apesar de ter uma discreta taquicardia (cerca de 103 bat/min) não apresentava alterações que justificassem a sintomatologia. A hipótese de hipoglicémia não se colocou pois não era diabética nem havia sintomatologia que podesse indicar esta hipótese.
Para além do desequilíbrio, não havia qualquer alteração neurológica perceptível.

Como não apresentava nenhum dado objectivo que justificasse uma deslocação ao SU, aconselhei-a a descansar e, caso os sintomas persistissem, a falar com a médica.

Não queiram saber qual é o meu espanto quando 2 dias depois fico a saber que tinha falecido na noite daquele dia... Fiquei com aquela sensação "Se eu tivesse enviado a senhora ao SU..."
Questionei então as pessoas que conheciam melhor a senhora e disseram-me que "tinha feito um exame ao coração e o médico disse-lhe que o coração dela estava muito fraquinho".

Apesar de tudo teve uma morte que eu, quando chegar a minha vez, desejo para mim: sem sofrimento! Tomara eu poder viver até aos noventa e tal com a qualidade de vida/saúde com que aquela senhora viveu. Nós é que temos um pouco a mania que todos temos de viver mais de 100 anos e que somos eternos. O certo é que todos temos o nosso momento e, o dela, era aquele. Que Deus a guarde em eterno descanso.

5 comentários:

Anónimo disse...

SERÁ QUE UMA CARGA DE CONHECIMENTO MAIS ADEQUADO NÃO TERIA SALVO A VIDA DESTA SENHORA? SERÁ QUE O SENHOR NÃO FOI NEGLIGENTE?
CONVIVA COM ISSO....

Vítor disse...

Caro anónimo,

1) Acho que é cobardia esconder-se atrás do anonimato.

2) Provavelmente o sr. deve ser o melhor médico ou enfermeiro do mundo pois nunca teve dúvidas

3) O sr. faz ideia de quantas vezes temos situações parecidas com esta que não passam de ansiedade de idosos que querem mais atenção de quem cuida deles. Neste mesmo lar vive uma idoso que há mais de 2 anos ouço dizer quase diariamente que está a morrer... Provavelmente o senhor levá-la-ia diariamente ao hospital, não?

4) E o senhor por acaso sabe quais os meus conhecimentos?

Para a próxima seja mais ponderado no que diz... e de preferência com mais argumentos!

Anónimo disse...

Não tenho qualquer ligação ao mundo da saúde, mas admiro muito quem tem, tendo que lidar ao segundo com decisões deste nível...

Anónimo disse...

olá,
acho que tomou a decisão certa!
mesmo não sendo a melhor, pois a vida é assim mesmo cheia de altos e baixos...
é uma profissão maravilhosa cuidar de pessoas, mesmo com um salário baixo. cabeça erguida e siga em frente!

Unknown disse...

Parece-me que a senhora, na dignidade dos seus 90 e tal anos, manifestou estranheza no seu sentir. Confiou nos seus conhecimentos técnicos e estava longe de considerar aquel o seu "prazo limite". Aprendemos errando. Não se escude na lei natural da vida. Aprenda com o seu erro, analise o que fez e, sobretudo, o que deveria ter feito e quando abordar os seus pacientes encare-os como um seu familiar. Vai ver a diferença a surgir no seu comportamento!